23/12/2007


Era dessas mulheres conformadas que viviam para seus maridos. Como aquelas de Atenas. Lia livrinhos de romances e suspirava antes de dormir, tocando-se timidamente com medo de o marido acordar e flagrá-la no momento de seu maior prazer, quando fechava os olhos e sentia-se a mocinha arrebatada dos livros ingênuos que a deixavam pegando fogo.

Como poderiam romances tão bobos a excitarem daquele jeito? Seu corpo era ainda muito atraente e pintava os cabelos de quinze em quinze dias. Uns diziam que nem parecia estar chegando aos quarenta. Nunca bebia, não fumava, e sexo fazia por tabela. Bem, usava tabela, melhor dizendo. E também o fazia por tabela porque se aproveitava dos beijos dados pelas garotas corajosas dos melodramas das Sabrinas da vida.

Levantou de má vontade, foi ao banheiro e se olhou no espelho enquanto tirava a camisola para entrar no chuveiro. E com a água escorrendo pelo corpo ainda jovem, fechou os olhos e deixou Robert entrar no box.
Robert era alto, loiro e de porte atlético. Texano e rude, apalpava suas coxas e a beijava como um touro sob as águas mornas … Ficava miúda em seus braços fortes e seus cabelos brancos de tão loiros, mesmo molhados brilhavam como os de um príncipe.

Ele a puxa com certa violência. Ela de costas e ele morde sua nuca. Ela teme desmaiar mas ele é forte e a sustenta no ar. Sua respiração é arfante. Ele é tão viril, tão…

A porta do banheiro é aberta pelo marido que, de ressaca mija na tampa do vaso enquanto esbraveja o preço do bacalhau e dos games para os meninos. Ela congela e sente-se a mulher mais sem sorte do planeta. Seu texano se fora, sem ao menos beijá-la em despedida. Que ódio. Que vida era aquela? Seu marido nem sentia desejo por ela alí, nua e excitada debaixo do chuveiro. E o Robert! O Bob se fora…

Seca-se e sai de toalhas para o quarto. Veste a roupa, um vestido costa nua florido e vai às compras de Natal. Ainda escuta um arroto e mais urina, provavelmente respingando fora do vaso.

No mercado vê que a decoração já foi ativada. Bolas douradas e vermelhas, banners de Papai Noel por toda parte. Entra na seção de vinhos e dá de cara com um… Papai Noel estilizado. Ele veste calças jeans, botas pretas e uma jaqueta de couro vermelha. Usa um boné verde e tem bigodes e cavanhaques de verdade. Tudo castanho claro. No boné está escrito o nome de um vinho. Ele é um desses promotores de venda, certamente, ela pensou.

Experimenta um pouco do vinho em uma tacinha descartável e lambe os lábios. Não percebe que o rapaz a observa encantado enquanto lhe estende outra taça. E mais outra.

Ela fica por horas perambulando pelas seções e já nem pensa mais em Bob. Afinal, ele não passava de um personagem daqueles livrinhos odiáveis que a deixavam em estado lastimável de desejo ao lado do marido beberrão que reclamava de tudo.

Quando volta à seção dos vinhos para mais uma rodada de tacinhas, ele já não está lá. Papai Noel se fora, levando consigo sua esperança de uma aventura menos… fictícia.

Frustrada, balança a cabeça entorpecida pelo encorpado tinto e seu sangue esquenta ao lembrar que traíra Bob. Pobrezinho que vinha do Texas para amá-la todas as noites. Às vezes à tarde. E hoje, pela primeira vez fariam amor no chuveiro, mas o cachorrão do marido resolvera mijar logo naquele momento.

Se dirige ao estacionamento com o carrinho cheio de castanhas, bacalhau, frutas cristalizadas e muitas garrafas de vinho tinto. Agora esperaria por Bob, tomando aquele delicioso vinho escuro.

Quando vai guardar as compras no porta-malas, ele aparece solícito a lhe ajudar com a tarefa. Já não está de boné, mas mantém a jaqueta de couro vermelho sangue e as botas pretas. Os lábios abrem num sorriso fascinante. Ela estremece de desejo em pleno estacionamento. A chuva cai lânguida e fresca sobre eles.

Guardam as compras. Ela, em silêncio, tira uma garrafa de vinho da sacola, fecha o porta-malas e passa para ele abrir. Ela entra no carro, abre a porta do carona e parte depois que Papai Noel entra.

Para onde iria? Não importava. Desde que não fosse para casa lavar o banheiro.

E quanto a Bob… bem. Ele não precisava saber. Afinal, era muito fácil guardá-lo entre as páginas do livro. Sorriu extasiada enquanto se perguntava há quanto tempo não se dava um presente de Natal… (Blog da Dai)

Para bom entendedor, um pingo é letra...

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